Fora da Caixa


Gosto de pessoas caóticas. Não no sentido dramático, de quem espalha o caos e depois finge que foi o universo. Não. Gosto daquelas pessoas que não se encaixam — por convicção. Que não vivem dobradas para caber num molde, nem escondem o que são para se tornarem mais confortáveis para os outros. São desorganizadas, sim. Mas só para quem não tem coragem de as ver por dentro.


Gosto dessas pessoas fora da caixa. Mesmo que a caixa tenha sido desenhada por gente séria, com esquadro e régua, e que nos diga que há linhas a seguir. Gente dessas que acredita que integridade é seguir um manual. E que lealdade tem a ver com sangue — como se partilhar ADN significasse, obrigatoriamente, partilhar valores. Sim, é para esses que este texto também é.


Pessoas fora da caixa não seguem linhas. Escrevem por cima delas. Rabiscam os cantos. Apagam os rótulos e colocam outros. Não é rebeldia gratuita — é só a recusa de viver uma vida que não se sente como sua. E é aí que reside a sua força. E, convenhamos, o seu perigo para quem vive de aparências.


A integridade dessas pessoas não está no cumprimento cego de regras, mas no instinto inato de não trair o que são. De dizer o que pensam, mesmo que ninguém goste. De fazer o que é certo, mesmo que não dê jeito. E de serem, apesar do mundo, fiéis a si mesmas. Isso, meus caros, não se ensina. E não se molda. Apenas se reconhece — e, com sorte, respeita.


E depois, há a lealdade. Ah, a lealdade. Não a dos brindes forçados, nem a dos jantares de grupo em que se jura amizade eterna por WhatsApp. Mas a verdadeira. Aquela que se mede no silêncio. No estar. No proteger. No dizer “estou aqui” quando o chão nos foge dos pés e ninguém mais aparece. Essa lealdade é rara. E, para quem sabe reconhecê-la, vale mais que qualquer laço de sangue. Porque sangue pode juntar, mas só o carácter sustenta.


E o mais curioso? Estas pessoas não pedem palco. Não precisam de aprovação. Nem têm paciência para grandes encenações. Elas existem à margem da norma, mas carregam dentro de si mais humanidade do que muitos que vivem religiosamente dentro dela.


São desarrumadas, sim. Inquietas. Inconvenientes. Mas, acima de tudo, são inteiras. E é isso que incomoda tanta gente.


Talvez o mundo precise de menos gente perfeita e mais gente real. De menos filtros e mais autenticidade. De menos obediência e mais coragem. Porque, no fim, quem tem carácter não precisa caber. Basta ser.





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