Eu sempre defendi piamente que o oposto do amor não é o ódio, e sim a indiferença. E eu ainda concordo totalmente com essa teoria, mas há alguns dias atrás, quando li o relato de uma pessoa sobre o seu relacionamento abusivo, pude entender que nem sempre se trata somente de indiferença explícita – às vezes também se trata de discurso.
Porquê o discurso do amor não é o ódio?
O ódio não é o oposto do amor, porque enquanto alguém odeia algo, essa pessoa mantém uma ligação com o objecto (neste caso, com uma pessoa, porque eu estou a fala de seres humanos).
Quando alguém odeia uma pessoa, é porque está conectado a ela. Essa pessoa deposita energia nela. Pensa nela. E provavelmente isso causa-lhe desconforto, mal estar, dano.
Existe uma frase do Herman Hesse, que diz o seguinte:
“Se odeia alguém, é porque odeia alguma coisa nessa pessoa que faz parte de si. O que não faz parte de nós não nos perturba”.
Pensamentos relacionados ao ódio são pensamentos maus, frequentemente devastadores. Se eu nutro esse tipo de sentimento, no final das contas, acabo por dar poder a alguém que presumivelmente, nem deveria fazer parte da minha vida, dos meus pensamentos e do meu coração.
Sendo assim, a partir do momento em que não me importo mais, deixo de odiar, deixo de investir a minha energia, porque quando alguém é realmente insignificante na minha vida, deixo de sentir o que quer que seja. Não sinto nada. Passou a ser indiferente, é indiferente. E neste cenário, o ódio dá o espaço para o vazio.
Se me perguntarem como deixar de odiar, eu infelizmente não tenho uma fórmula mágica ou 5 passos mirabolantes para acabar com o ódio na minha vida, mas eu posso assegurar que tem a ver comigo, e não com a outra pessoa.
Porque seja lá o que for que a outra pessoa me tenha feito ou de que forma ela me tenha ferido ou magoado, essa pessoa não merece ter poder na minha vida. Ela não é uma extensão minha e devo cortar o fio que nos liga.E se ódio for o fio de ligação entre nós, ele deve ser cortado. Imediatamente.
Como? Acredito que o perdão seja a maneira mais adequada. Porque perdoar não tem a ver com o outro, na verdade, tem a ver com comigo. Perdoar não é esquecer, o nome disso é amnésia. Perdoar é livrar-me de pesos que não são os meus e seguir adiante. Sem laço. Sem fio. Sem ódio. Sem nada, além do vazio.
Atitudes são para os que amam - para os que não amam, resta o discurso
Porquê, então, em alguns casos, o discurso é o contrário do amor (e não a indiferença)?
Porque simplesmente uma pessoa pode-me ser indiferente (os meus sentimentos, a minha presença, a minha vida), mas fingir estar muito interessado, preocupado, apaixonado.
E mesmo que as acções também possam ser fingidas, elas geralmente são mais difíceis de sustentar do que o discurso.
Costumeiramente acções fingidas alternam-se com acções reais. Ou seja, a pessoa age de uma forma num dia, mas de outra forma no outro. É aquela tal famosa “pessoa de lua”. Às vezes é carinhosa, noutras é agressiva. Às vezes trata bem, noutras humilha, desaparece e magoa. Mas o discurso é sempre o mesmo: “gosto tanto de ti” (“eu tenho muito carinho por ti”, “eu faço isto para teu bem”, “ninguém nunca vai te entender tanto como eu”, “eu importo-me com contigo”, blá, blá, blá).
Porque a pessoa não diz que odeia, não dá um basta na relação. Independente das acções, ela diz que gosta muito. E justifica as acções com um turbilhão de desculpas, sempre.
Uma pessoa pode dizer que gosta muito de mim, fazer declarações lindas , mas se as acções dela não forem congruentes e condizentes (sempre!) com todo o discurso, muito provavelmente, ela só se ame somente a si mesma..... Ou pior, se for casado, engana a mulher! A maioria das vezes é o que acontece com este tipo de homens. Pessoas disfuncionais. Querem tudo, mas não fazem nada para as ter, bem pelo contrário.
Nem sempre a indiferença é observável, porque ela pode ser forjada, mascarada, manipulada. Por um tempo, óbvio. Mas às vezes, tempo necessário para causar muitos danos.
Aliás, essa é uma realidade muito dura de enfrentar, mas é preciso: muitas pessoas fingem, mentem, e manipulam. É preciso que se esteja muito atento.
É fácil falar bonito, muitos psicopatas, inclusive, tem um poder incrível de persuasão. E o pior de tudo: eles também têm um poder enorme de sedução!
Muitas pessoas utilizam o discurso justamente para “tapar o buraco”. Não conseguem sustentar uma (ou várias) mentira (s) com as acções e por não conseguirem mantê-las congruentes, acabam apelando para o discurso barato, manipulador e narcisista.
Quem gosta, age. Quem não gosta, fala, fala, fala. Grita aos quatro cantos. Encena. Chega a ser teatral.
É um psicopata com um poder incrível de persuasão..... fez-me viajar no tempo, e agora a dor voltou!
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